Dois dias após uma megaoperação no Rio de Janeiro contra o Comando Vermelho que deixou 121 mortos, o presidente Lula sancionou na quinta-feira (30) lei endurece penas contra quem tenta impedir ou obstruir investigações contra organizações criminosas. O projeto, aprovado no Congresso no início de outubro, é do senador Sergio Moro (União-PR), ex-juiz responsável por condenar o petista na Lava-Jato.
Pelo texto sancionado, quem ordena, ameaça ou pratica violência contra policiais, juízes, promotores, advogados, jurados, testemunhas ou peritos para impedir investigações ou processos envolvendo facções criminosas pode ser condenado a pena de 4 a 12 anos de reclusão, além de multa. A pena é a mesma para quem planejar ou conspirar para esse tipo de ataque.
Na prática, a nova legislação endurece a punição para ações como as adotadas por traficantes no Complexo do Alemão, na terça-feira (28), com uso de barricadas e bombas lançadas por drones para impedir o cumprimento de mandados de prisão contra integrantes da facção criminosa Comando Vermelho.
A lei também determina que os condenados e investigados por esses crimes devem ser mantidos em presídios federais de segurança máxima. Além disso, amplia a proteção pessoal de juízes, promotores, policiais e militares, incluindo familiares, que estejam em situação de risco por atuar contra o crime organizado, especialmente em áreas de fronteira.
Outro ponto da norma inclui no Código Penal a punição para quem solicitar ou contratar o cometimento de crime a integrante de associação criminosa.
Na quarta-feira (29), Lula afirmou que “não podemos aceitar que o crime organizado continue destruindo famílias”. Na primeira manifestação após a operação mais letal da polícia no Rio, o presidente defendeu “trabalho coordenado” que mire a “espinha dorsal do tráfico”:
“Não podemos aceitar que o crime organizado continue destruindo famílias, oprimindo moradores e espalhando drogas e violência pelas cidades. Precisamos de um trabalho coordenado que atinja a espinha dorsal do tráfico sem colocar policiais, crianças e famílias inocentes em risco”, escreveu nas redes sociais.
A lei
Publicada no Diário Oficial da União (DOU), a lei nº 15.245 tipifica as condutas de “obstrução” e de “conspiração para obstrução” de ações contra o crime organizado. “Diante de situação de risco, decorrente do exercício da função, das autoridades judiciais ou membros do Ministério Público, em atividade ou não, inclusive aposentados, e de seus familiares, o fato será comunicado à polícia judiciária, que avaliará a necessidade, as condições institucionais perante outros órgãos policiais, o alcance e os parâmetros da proteção pessoal”, diz a lei.
O texto estende a proteção pessoal a todos os profissionais das forças de segurança pública, Forças Armadas, autoridades judiciais e membros do Ministério Público – com atenção especial aos que combatem o crime organizado nas regiões de fronteira.
A nova lei também altera o Código Penal para estender o crime de “associação criminosa” – com pena de um a três anos de reclusão – para quem “solicitar ou contratar o cometimento de crime a integrante de associação criminosa, independentemente da aplicação da pena correspondente ao crime solicitado ou contratado”.
O texto também altera a lei de 2013 que define organização criminosa, incluindo dois artigos sobre “obstrução” e “conspiração para obstrução” de ações contra o crime organizado – quando duas ou mais pessoas se associam para a prática.
Em ambos os casos, fica estabelecida pena de reclusão de 4 a 12 anos, além de multa, para quem “solicitar, mediante promessa ou concessão de vantagem de qualquer natureza, ou ordenar a alguém a prática de violência ou de grave ameaça contra agente público, advogado, defensor dativo, jurado, testemunha, colaborador ou perito, com o fim de impedir, embaraçar ou retaliar o regular andamento de processo ou investigação de crimes praticados por organização criminosa ou a aprovação de qualquer medida contra o crime organizado”.
Tantos os presos provisórios quanto os condenados por esses crimes deverão iniciar o cumprimento da pena em estabelecimento penal federal de segurança máxima.
Deputado quer convocar Lewandowski
O deputado federal Rodolfo Nogueira (PL-MS) apresentou requerimento na Comissão de Segurança Pública e Combate ao Crime Organizado para convocar o ministro da Justiça e Segurança Pública, Ricardo Lewandowski, a fim de prestar esclarecimentos sobre declarações e decisões contraditórias a respeito da Operação Contenção, deflagrada no Rio de Janeiro. Segundo o requerimento, tanto o ministro quanto o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues, admitiram publicamente que a PF foi comunicada antecipadamente sobre a operação — que visava desarticular a facção criminosa Comando Vermelho —, mas decidiu não participar, sob a justificativa de que “não haveria atribuição legal” para atuar no caso.
Para Nogueira, essa decisão revela omissão institucional e afronta ao dever constitucional de cooperação entre os entes federativos, previsto no artigo 144 da Constituição Federal e na Lei nº 13.675/2018, que criou o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP). O parlamentar afirma que, diante de uma das maiores operações contra o crime organizado no estado, a recusa da PF demonstra falta de coordenação e comprometimento do Governo Federal com a segurança pública nacional.
Além da ausência da Polícia Federal, o deputado também destaca a negativa do governo em autorizar o uso das Forças Armadas em apoio às forças estaduais.
Além da ausência da Polícia Federal, o deputado também destaca a negativa do governo em autorizar o uso das Forças Armadas em apoio às forças estaduais.
Policial morto do Bope recebe homenagens

O corpo do policial Heber Carvalho da Fonseca, de 39 anos, foi enterrado no início da tarde desta quinta-feira, 30, em Sulacap, na zona oeste do Rio. Ele e o também 3º sargento Cleiton Serafim Fonseca, de 42 anos, morreram durante megaoperação nos complexos do Alemão e da Penha contra integrantes do Comando Vermelho
No início da manhã, os corpos dos agentes do Batalhão de Operações Policiais (Bope) foram velados na sede da corporação, na zona sul da capital.
Um cortejo com o corpo do agente saiu do batalhão no caminhão do Corpo de Bombeiros e seguiu por ruas da cidade até chegar a Sulacap. Mais de 100 pessoas, entre amigos, familiares e colegas de farda, estiveram no sepultamento do agente. O enterro teve forte comoção e diversas homenagens.
O helicóptero da Polícia Militar fez voos sobre o cemitério. Também houve honrarias militares com a presença da Marinha do Brasil. Tiros de honra foram disparados pela corporação da Polícia Militar.
Os agentes da corporação fizeram a oração do Bope e foram aplaudidos. O agente estava na corporação desde 2008. Ele deixa esposa, um casal de filhos e um enteado.
Já o corpo de Gonçalves, que estava na corporação desde 2011, será levado para a cidade de Mendes, no sul fluminense, e o enterro está previsto para as 16h30. Ele deixa esposa e uma filha.
Outros policiais enterrados
Na quarta, os outros dois policiais civis mortos na megaoperação foram sepultados. Rodrigo Veloso Cabral, de 34 anos, tinha entrado na corporação há 40 dias. Ele estava lotado na 39ª DP, na Pavuna, e foi enterrado no Cemitério Memorial do Rio, na zona norte.
Já Marcus Vinícius Cardoso de Carvalho, de 51 anos, chefiava a 53ª DP, em Mesquita, na Baixada Fluminense. O corpo dele foi sepultado no Cemitério da Cacuia, na Ilha do Governador.
A megaoperação contra o CV deixou ao menos 121 mortos, incluindo os quatro policiais.
Em nota, a Polícia Civil se solidarizou com os familiares dos policiais mortos e disse que “os ataques covardes de criminosos contra nossos agentes não ficarão impunes”.
O governador Cláudio Castro também prestou solidariedade aos amigos e familiares dos policiais mortos. De acordo com o chefe do Executivo fluminense, “como forma de reconhecimento e respeito, todos serão promovidos postumamente”.
“Hoje o Rio de Janeiro amanheceu de luto. Marcus Vinícius Cardoso de Carvalho, comissário da 53ª DP, Rodrigo Velloso Cabral, da 39ª DP, Cleiton Serafim Gonçalves e Heber Carvalho da Fonseca, ambos sargentos do Bope, deram a vida cumprindo o dever de proteger a população fluminense. Minha solidariedade e minhas orações estão com as famílias, amigos e colegas de farda desses heróis. ”, escreveu.
Motta elogia Lula e Moro por lei contra crime
O presidente da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos), cumprimentou o presidente Lul (PT) e o senador Sergio Moro (União Brasil-PR) pela aprovação da lei que fortalece o combate ao crime organizado no Brasil. O relator, deputado Rubens Pereira (PT-MA), também foi mencionado.
A relação entre Lula e Moro teve início durante as investigações da Lava Jato, quando o atual senador atuava como juiz federal responsável pelos processos relacionados à operação. Em 2017, Moro condenou Lula em um dos processos da Lava Jato. O STF (Supremo Tribunal Federal) anulou esses processos em 2021 e declarou que o então juiz havia agido com parcialidade no caso. Já eleito presidente pela 3ª vez, Lula disse ao site Brasil247 em 2023 que desejava “foder” Moro durante o período em que esteve preso.
A lei foi sancionada pelo presidente 1 dia depois da operação Contenção, deflagrada pelas polícias Civil e Militar do Rio de Janeiro nos complexos do Alemão e da Penha. Com 121 mortes confirmadas pelo governo estadual, sendo 4 policiais e 117 civis, essa ação tornou-se a mais letal da história do país.
A aprovação desta lei na Câmara dos Deputados, no início de outubro, deu-se na esteira da execução do ex-delegado Ruy Ferraz Fontes, em Praia Grande, na Baixada Santista (SP). Aposentado da polícia, Fontes foi responsável, em 2006, por indiciar toda a cúpula do PCC (Primeiro Comando da Capital), incluindo o líder Marcos Willians Herbas Camacho, o Marcola.
por Tribuna do Norte

