Trump bloqueia verbas de pesquisa para pressionar universidades a acatar demandas da Casa Branca

Harvard processou o governo norte-americano após ter US$ 2,2 bilhões congelados. Outras 59 instituições estão sendo investigadas pelo Departamento de Educação, acusadas de se omitir no combate ao antissemitismo

O governo federal americano está usando verbas destinadas à pesquisa científica para pressionar universidades a concordarem com uma série de demandas da administração Trump. O caso mais emblemático é o de Harvard: o governo suspendeu o repasse de US$ 2,2 bilhões previstos para projetos de pesquisa da universidade depois que ela se recusou a acatar uma lista de medidas que dariam à Casa Branca a prerrogativa de intervir sobre diversos aspectos de gestão da instituição — entre elas, o direito de auditar a contratação de docentes, a admissão de alunos e a origem e alocação de recursos por parte da universidade.

As exigências estão descritas em uma carta de cinco páginas enviada por via eletrônica à reitoria de Harvard na noite de 11 de abril, uma sexta-feira. Assinada por três autoridades, ela acusa Harvard de desonrar as “condicionantes intelectuais e de direitos civis que justificam investimento federal” na universidade, e apresenta uma série de medidas a serem adotadas, em caráter imediato e mandatório, para “preservar a relação financeira” dela com o governo federal. 

O documento exige, entre outras coisas, a extinção “imediata” de todas as políticas de diversidade, equidade e inclusão (DEI) da universidade, e a realização anual de auditorias externas sobre a “diversidade de pontos de vista” contemplados nas atividades e no corpo acadêmico da instituição. Em departamentos ou disciplinas onde essa diversidade fosse considerada insuficiente, segundo a carta, a universidade seria obrigada a recrutar uma “massa crítica” de professores e alunos com pontos de vista distintos para, supostamente, equilibrar o debate. O documento também exige que Harvard “reduza o poder” de estudantes e docentes envolvidos com ativismo, e adote regras mais rigorosas para punir alunos e grupos envolvidos em protestos ou transgressões disciplinares.

Três dias depois, em 14 de abril, o reitor de Harvard, Alan Garber, publicou uma carta aberta à comunidade, informando que não iria acatar as demandas do governo. “A universidade não abrirá mão de sua independência nem abdicará de seus direitos constitucionais”, escreveu Garber. Foi a primeira universidade a confrontar abertamente as demandas do governo Trump. “Nenhum governo, independentemente de qual partido está no poder, deveria ditar o que as universidades privadas podem ensinar, quem elas podem admitir ou contratar, e em quais áreas de estudo ou pesquisa ela podem investir”, justificou Garber.

A reitoria de Harvard já vinha conversando reservadamente com o governo desde 3 de abril, quando recebeu uma lista de demandas iniciais; mas a carta do dia 11 implodiu as negociações. “É, praticamente, uma tentativa de intervir na universidade”, avalia Jacques Marcovitch, professor emérito da Faculdade de Economia, Administração, Contabilidade e Atuária (FEA) e ex-reitor da USP, referindo-se ao teor da carta. Um dos objetivos dessa intervenção, segundo ele, seria inibir questionamentos e críticas da comunidade acadêmica às políticas de “baixa densidade intelectual” que o governo Trump vem apresentando. “Na história mundial, todos os governos populistas acabaram procurando inibir a liberdade dentro das instituições, especialmente as instituições acadêmicas”, afirma Marcovitch, em entrevista ao Jornal da USP.

“A ideia de pegar Harvard é a ideia de calar um sistema que está na base daquilo que se chama de democracia liberal americana”, argumenta, também, o sociólogo Glauco Arbix, professor da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP e ex-presidente da Finep, em entrevista ao programa Além do Algoritmo, da Rádio USP. “Quando ele (Trump) quer calar essas universidades, ele quer evitar que elas falem, que elas se pronunciem, que elas tenham voz, que elas se mobilizem e que elas anunciem que existem outras opções”, afirma Arbix, que realizou pesquisas de pós-doutorado em várias instituições americanas, incluindo Columbia, MIT e Universidade da Califórnia em Berkeley. “Ele quer chegar a ter o controle e o cancelamento de qualquer tipo de oposição a ele.”

A retórica trumpista é frequentemente hostil às universidades. Em um vídeo de campanha postado em julho de 2023, Trump descreve-as como instituições “dominadas por maníacos e lunáticos marxistas” e promete “recuperar nossas outrora grandes instituições educacionais da esquerda radical”. Já o vice-presidente J.D. Vance fez um discurso em 2021 na Flórida intitulado “As universidades são o inimigo”, em que diz ser necessário “atacar agressivamente” essas instituições para avançar com reformas conservadoras na política americana. Ele acusa as universidades de manipular o debate público e produzir “pesquisas que dão credibilidade a algumas das ideias mais ridículas que existem em nosso país”. “Senhoras e senhores, as universidades não buscam o conhecimento e a verdade; elas buscam o engano e a mentira, e está na hora de sermos honestos sobre esse fato”, disse. 

Na avaliação da professora Lorena Barberia, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da USP, para além da questão ideológica, essa pressão sobre as universidades tem como pano de fundo, também, uma frustração mais antiga da base política de Trump (majoritariamente branca, de classe média e conservadora), que se ressente da estagnação socioeconômica e do fato de não ter acesso a essas instituições de elite, tanto por conta dos altos custos quanto das políticas de diversidade e equidade, que são interpretadas como uma forma de discriminação racial contra brancos. “A universidade é símbolo de um problema muito grave da crise econômica americana”, diz Barberia, que fez mestrado em Harvard. “O custo de estudar em uma instituição privada nos Estados Unidos está cada vez mais inacessível para a classe média. Isso é dramático, porque a maioria das famílias não consegue ascender a essas universidades”, apesar de elas também receberem recursos públicos, completa a professora. 

Trump começa seu vídeo de campanha tocando justamente nesta ferida: “Por muitos anos, os custos de mensalidades em faculdades e universidades vêm explodindo, e digo explodindo absolutamente, enquanto acadêmicos têm estado obcecados em doutrinar a juventude americana. (…) As faculdades receberam centenas de bilhões de dólares de contribuintes que trabalham duro e agora vamos tirar essa insanidade antiamericana de nossas instituições de uma vez por …

RN é o 3º estado com a maior taxa de mortes por saneamento inadequado

Com saneamento básico incompleto e ainda com deficiências em fornecimento de água, o Rio Grande do Norte registrou a 3ª maior taxa de óbitos por 100 mil habitantes por Doenças Relacionadas ao Saneamento Ambiental Inadequado (DRSAIs), segundo um estudo do Instituto Trata Brasil. A taxa do RN ficou em 4,814 mortes por 100 mil habitantes. Por outro lado, o levantamento do Trata Brasil apontou que o RN tem a menor taxa de internação do país por essas doenças, que impactam significativamente mais crianças e idosos. Segundo especialistas, a falta de investimentos em saneamento no Brasil coloca a saúde dos brasileiros em risco e sobrecarrega o SUS com “doenças evitáveis”.

Os dados de óbitos utilizados pelo estudo são do SUS e são referentes à 2023. Especialistas apontam, no entanto, que a situação não mudou de lá para cá, uma vez que os investimentos nas ações de saneamento são sentidas a médio e longo prazo em conjunto com ações de promoção de saúde. O estudo do Trata Brasil divide as doenças relacionadas ao saneamento nas que são de transmissão oral, como diarreias, salmonelose, cólera, amebíase, febre tifoide e hepatite A, e as doenças de transmissão por insetos, como febre amarela, malária e doença de chagas. Também abarcam doenças transmitidas por contato com água contaminada, como esquistossomose e leptospirose, falta de higiene, entre outras questões.

De acordo com o estudo do Trata Brasil, em relação aos óbitos por transmissões feco-oral o RN ficou atrás somente de Roraima (7,539) e Piauí (5,441). Completam o top-5, além do RN o Amazonas (4,364) e o Pernambuco (3,644). Já em relação às doenças transmitidas por insetos o RN registrou a 2ª menor taxa do Nordeste (0,878) e a 5ª menor do Brasil. A maior do país é Goiás (9,466), seguida pelo Distrito Federal (8,341).

Apesar dos índices, o estudo revela que há uma perspectiva de “trajetória positiva”, uma vez que o aumento da cobertura de saneamento tem contribuído para a redução do número de mortes relacionadas a essas doenças. No Brasil, a taxa por cem mil habitantes apresentou leve redução: caiu de 6,3 em 2008 para 5,6 em 2023. A queda ainda é baixa, segundo o estudo. Das 5.570 cidades brasileiras, apenas 1.031 tiveram redução da taxa de mortalidade entre 2008 e 2023, com 2.791 estagnadas e 1.748 com aumento da taxa de mortalidade.

Na avaliação de André Machado, coordenador de Relações Institucionais e Comunicação do Instituto Trata Brasil, um óbito causado por uma doença relacionada ao saneamento ambiental inadequado é um “problema que poderia ser evitado” e tem múltiplos fatores, que vão desde o tipo da doença, a forma que o paciente contraiu o vírus, até o tratamento da enfermidade.

“O processo é amplo com várias camadas de gravidade. A estrutura de saneamento é a primeira, que coloca o cidadão em nível de exposição a pegar aquela doença. Se ele vai contrair, se vai ser recorrente, existem outras explicações. O fato de ele chegar a óbito é uma camada maior ainda, depende da qualidade do SUS, do número de médicos à disposição, nível ambulatorial, programa de saúde da família. Para a morte, a complexidade é maior, não conseguimos dar uma resposta exata a partir do saneamento” aponta, citando ainda que a universalização do saneamento precisa ser tratada como prioridade. “O Plano Nacional de Saneamento Básico indica para nós que o investimento ao ano por cada habitante deveria ser de 239,09, mas ainda estamos investindo R$ 111,44. Precisaríamos mais do que dobrar para chegar no montante ideal”, cita.

Na avaliação do professor do Departamento de Saúde Coletiva da UFRN, mestre em enfermagem e doutor em educação, José Jaílson de Almeida Junior, o fato de essas doenças ainda levarem pessoas à morte aponta o desafio da universalização do saneamento básico no Brasil, especialmente nas periferias dos grandes centros e acesso dos pequenos municípios aos investimentos.

“Isso é reflexo de um processo histórico de desigualdades no acesso às políticas públicas, como as que garantem o acesso à habitação. Não podemos pensar no saneamento básico sem garantir moradia e acesso à água potável. São medidas que no médio e longo prazo desafogariam o sistema de saúde. Também precisamos garantir um acesso adequado na atenção básica de saúde”, explica.

Cobertura

O presidente da Caern, Roberto Linhares, aponta que a companhia tem avançado na cobertura de saneamento e fornecimento de água do Estado, com perspectivas a curto e médio prazo de ampliar os índices. Sobre os óbitos, Linhares cita que mesmo tendo havido redução do número de internações, o surgimento de bactérias mais resistentes a antibióticos, fato que teve implicações mais intensas na população mais idosa, pode ser uma das explicações para a taxa do RN.

“A gente entende que o esgoto é algo fundamental à saúde. Não é à toa que a OMS considera que para cada R$ 1 investido em esgotamento, deixa-se de investir R$ 4 em saúde pública, por causa do impacto nessas doenças de veiculação hídrica. Quando se visita uma área que tem esgotamento sanitário, até a pele das crianças tem coloração diferente, é mais amarelada onde não tem. A evolução dos indicadores com certeza vai reduzir a quantidade de óbitos, mas há uma comprovação de que no RN tem uma resistência maior ao tratamento com antibióticos numa determinada bactéria que fica mais difícil de ser tratada”, explica.

Linhares: esgotamento é fundamental para a saúde | Foto: Adriano Abreu

Caern: cobertura vai aumentar até o fim de 2025

A cobertura de saneamento básico deve ter um acréscimo até o final de 2025, segundo estimativas da Caern. Segundo os dados do Trata Brasil, 21,6% da população do RN não tem acesso à água e 70,3% sem acesso à coleta de esgoto. A Caern aponta dados diferentes, com 84,5% de atendimento com água, 95% de cobertura e 26,6% à coleta de esgoto.

“Esse acesso à água que o Trata Brasil coloca inclui também área rural, que não é responsabilidade da companhia, e áreas irregulares do ponto de vista fundiário que não podemos atuar. A cobertura com água no RN …